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Quando ciência e fé se encontram, três coisas podem acontecer: ódio, indiferença ou amor.


Cada época tem seus heróis e seus monstros. A grande mentira da nossa é que os cientistas são os heróis que destruíram os monstros da religião.

Cada época tem seus heróis e seus monstros. A grande mentira da nossa é que os cientistas são os heróis que destruíram os monstros da religião.
Todos sabem que cada época tem seus heróis e seus monstros, suas verdades e suas mentiras. A grande mentira de hoje é que os cientistas são heróis que destruíram os monstros da religião. É a suposta vitória da racionalidade sobre a ignorância da superstição, especialmente a “institucionalizada nas grandes religiões” (leia-se aqui “Igreja católica”). A caricatura desta vitória seria o caso Galileu. Mártir da sabedoria, ajoelhado perante o clero maligno na grande e opressora sala do Santo Ofício, de dentes cerrados negando a sua vitoriosa teoria heliocêntrica, mas resistindo bravamente ao dizer “eppur si muove” (e, no entanto, ela se move). Tudo falso, inclusive a cena descrita, puro fruto da imaginação.
Basicamente, três coisas podem acontecer quando ciência e fé se encontram: ódio, indiferença ou amor.
Parece estranho falar de sentimentos para relacionar ciência e fé, mas é que não podemos esquecer que o encontro das duas acontece na nossa mente e, portanto, está condicionado às nossas maneiras de interpretação e sentimento.
O caso da indiferença é simples. Julga-se que a fé é simplesmente um ato (necessário para o homem) de aceitação do desconhecido – e que a ciência é a superação desta ignorância da realidade. Neste ponto de vista, ciência e fé são indiferentes uma à outra porque não se interceptam, como se diz na teoria matemática dos conjuntos. Os elementos que fazem parte do conjunto da fé deixam de lhe pertencer e passam para o conjunto da ciência, quando o homem consegue, através da técnica, dominar o desconhecido. Foi o que aconteceu, por exemplo, depois que passamos a compreender a nossa própria origem de modo científico. A descrição religiosa do livro do Gênesis passou a ser uma fábula. Para os adeptos da indiferença, a fé vai sendo naturalmente suplantada pela ciência e, inexoravelmente, se tornará um conjunto vazio. Não há conflito porque este é um processo natural. Para mim, esta é uma posição simplista, que não considera as nuances do processo de deslocamento de um elemento do conjunto da fé para o conjunto da ciência e, mais ainda, ignora por completo que as explicações (tanto científicas quanto religiosas) são bem mais complicadas (e muitas vezes incompletas) do que parecem.
Os que defendem o ódio no encontro entre as duas pensam de modo semelhante ao anterior. Para eles, no entanto, o conjunto da fé nunca se esvazia porque os religiosos não abrem mão das suas fábulas. Pensam que uma pessoa de fé prefere viver arraigada na ignorância a que se abrir à luz da razão. Há várias justificativas para esta atitude. A principal seria o medo. O conhecimento seria uma espécie de caminho de libertação e, abrindo mão de um único elemento do sagrado, precisaria necessariamente lançar-se ao desconhecido. Faltaria coragem. Embora incorreta, esta postura já é melhor do que a da indiferença. Ela está certa ao dizer que a fé nunca se torna um conjunto vazio, que o fato de explicar algo cientificamente não tira necessariamente esse elemento do conjunto da fé. E isto acontece porque, como dissemos antes, as coisas não são “tão simples” assim. Esta visão erra muito, entretanto, ao considerar a fé como um ato de covardia. Se a fé é dar um passo no escuro, este é, antes de tudo, um ato de coragem! Longe de ser um comportamento puramente instintivo, de quem procura se libertar a qualquer custo das garras da ignorância, ter fé e lançar-se ao desconhecido é algo que transforma toda a vida e exige, portanto, valentia para assumir as consequências. Este passo não é guiado pelo acaso. Ao contrário, é dirigido e sustentando por toda uma vastidão de elementos que o balizam e apontam para uma direção certa e concreta.
Do meu ponto de vista, a relação correta para o encontro entre ciência e fé é o amor. Existe uma relação de complementariedade, não de competição, entre as duas. Esta minha convicção não nasce de uma expectativa teórica, mas sim, antes de tudo, de uma experiência prática, constante, de pessoa de ciência e de fé. Observando o comportamento religioso, percebemos claramente que ele nada mais é do que uma busca pela Verdade. Esta Verdade é algo que nos transcende e, como tal, é capaz de dar sentido à nossa existência e à nossa própria condição limitada. No cristianismo, esta Verdade nos é revelada por Deus. Nós não a construímos: antes, a ganhamos. Claro que há uma busca, uma procura, mas o importante e fundamental é que Ela existe apesar de nós, nos precede, e sua realidade não depende da nossa existência nem da nossa consciência ou conhecimento dela. Deus nos manifesta esta Verdade de várias formas. Sem dúvida, Ele o fez através de Jesus, seu Filho, o Verbo divino encarnado, Deus e homem verdadeiro. Outra forma, menos direta, é através da criação. Evidentemente, a criação não tem status de Verdade, mas, certamente, aponta para Ela, dando glória ao Criador.
É justamente aí, nesse estudo do que a criação indica, que ocorre o harmonioso encontro entre ciência e fé.
A questão da existência e significado da verdade aparece na física quando nos questionamos sobre a realidade de um modelo físico. São modelos físicos para a órbita dos planetas, por exemplo, os epiciclos de Ptolomeu (séc. II) ou as órbitas elípticas de Kepler (séc. XVII). Os dois modelos tentam explicar a posição dos planetas no céu ao longo do tempo, mas se baseiam em trajetórias diferentes para os astros. Apesar de partirem de pressupostos completamente diferentes (no primeiro a Terra é o centro das órbitas enquanto no segundo o centro é o Sol), ambos preveem em muitos casos os mesmos resultados observacionais. Mas Kepler não deu a resposta final, pois, três séculos mais tarde, Einstein publicou a Teoria da Relatividade Geral e nos apresentou uma nova visão de como são os movimentos planetários. O conhecimento evoluiu: foi-nos dada uma visão melhor de como é a natureza.
Através dessas progressivas e contínuas melhorias do nosso conhecimento, vamos tendo acesso a uma Verdade que nos transcende. Não é mera questão de descrição matemática, mas um verdadeiro processo de encontro com uma Verdade que existe independente de nós. Isto não é panteísmo: nesta busca não se chega à conclusão de que “a matéria é Deus”. É uma busca realmente cristã, pois a criação é caminho para Deus. Nas palavras de Max Planck (1858-1947), precursor da mecânica quântica, “para o físico, Deus está no ponto de chegada de toda a sua reflexão”.
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O prof. Alexandre Zabot, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), é físico e doutor em Astrofísica. Aleteia lhe agradece pela generosidade de compartilhar conosco os seus artigos sobre as relações entre fé e ciência e convida os leitores a conhecerem o rico blog do professor, AlexandreZabot


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